29 agosto, 2010
26 agosto, 2010
Perdidos na excursão
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Bocas raivosas, por nada ter dado certo. Só confusão durante a excursão inteira.
Marquito relembrou a saída orgulhosa. Um final de semana ecológico-aventureiro. Certeza de voltar triunfantes! Muito pra contar e pra exibir. Turma animada e a fim de descobrir o esconderijo-paraíso dos micos-leões-dourados. Tiagão ouvia rindo. Logo enfezou. Lembrou da primeira desviada. Um caminho lindo que deu numa cachoeira despencante. Puladas, procuras, nadadas, volta estropiada pra estrada arrebentada... Depois, só mancadas... A chuva desviante da trilha. A paralisada hesitante se era pra virar à direita ou à esquerda. Os em-frente-marche dando em barreiras fechadas, sem brecha pra passagem. As voltas, semivoltas, voltas inteiras. A parada pra comilança quase dentro duma fazenda murada e o dono surgindo com as armas em punho... Horror total!!
Marquito parou de sorrir. Partiu pros desabafos gritados. A armação das tendas no escuro e a descoberta rápida de o lindo lugar estar cercado de cobras... Berros desesperados! O dar de cara com uma margem do rio sem nenhuma ponte para cruzar... O medaço de se afogar atravessando a pé.
Tiagão espirrou. Gripou bravo. Desligou avisando que foi a primeira e última excursão ecológica. Pra ele, fim de papo. Marquito resmungou enfezado. Jurou jurado. Outra, só sabendo antes por onde ia pisar. Chegava de perder tempo, perder a paciência, perder o ânimo.
Fanny Abramovich
Folhas Secas
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Todos?
Quase. Carolina equilibrava o apontador na ponta da régua, Lucas recolhia as borrachas dos vizinhos e construía um prédio, Renata conferia as canetas e os lápis do seu estojo vermelhíssimo e Hélder olhava para o pátio.
O pátio? O que acontecia no pátio?
Após o recreio, dona Natália varria calmamente as folhas secas e amontoava e guardava tudo dentro de um enorme saco plástico azul. Terminando o varre-varre, dona Natália amarrou a boca do saco plástico e estacionou aquele bafuá de folhas secas perto do portão. Hélder observava atentamente. E eu observava a observação de Hélder - sem descuidar
da minha aula de Matemática. De repente, Hélder foi arregalando os olhos e franzindo a testa.
Qual o motivo do espanto?
Hélder percebeu alguma coisa no meio das folhas movendo-se deseperadamente, com aflição, sufoco, falta de ar. Hélder buscava interpretações para a cena, analisava possibilidades, mas o perfil do passarinho já se delineava na transparência azul do plástico.
Um pássaro novo caiu do ninho e foi confundido com as folhas secas e foi varrido e agora lutava pela liberdade.
- Ele tá preso!
O grito de Hélder interrompeu o final da multiplicação de 15 por 127. Todos os alunos olharam para o pátio. E todos nós concordamos, sem palavras: o bico do passarinho tentava romper aquela estranha pele azul. Hélder saiu da sala e nós fomos atrás. E antes
que eu pudesse pronunciar a primeira sílaba da palavra “calma”, o saco plástico simplesmente explodiu, as folhas voaram e as crianças pularam de alegria.
Alguns alunos dizem que havia dois passarinhos presos. Outros viram três passarinhos voando felizes e agradecidos. Lucas diz que era um beija-flor. Renata insiste que era uma cigarra. Eu, sinceramente, só vi folhas secas voando.
Para concluir esta inesquecível aula de Matemática, pegamos vassouras, pás e sacos plásticos e fomos varrer novamente o pátio.
Francisco Marques (Chico dos Bonecos)
A seca e o inverno
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Na seca inclemente no nosso Nordeste
O sol é mais quente e o céu, mais azul
E o povo se achando sem chão e sem veste
Viaja à procura das terras do Sul
Porém quando chove tudo é riso e festa
O campo e a floresta prometem fartura
Escutam-se as notas alegres e graves
Dos cantos das aves louvando a natura
Alegre esvoaça e gargalha o jacu
Apita a nambu e geme a juriti
E a brisa farfalha por entre os verdores
Beijando os primores do meu Cariri
De noite notamos as graças eternas
Nas lindas lanternas de mil vaga-lumes
Na copa da mata os ramos embalam
E as flores exalam suaves perfumes
Se o dia desponta vem nova alegria
A gente aprecia o mais lindo compasso
Além do balido das lindas ovelhas
Enxames de abelhas zumbindo no espaço
E o forte caboclo da sua palhoça
No rumo da roça de marcha apressada
Vai cheio de vida sorrindo e contente
Lançar a semente na terra molhada
Das mãos deste bravo caboclo roceiro
Fiel prazenteiro modesto e feliz
É que o ouro branco sai para o processo
Fazer o progresso do nosso país
Cordel de Patativa do Assaré
O sol é mais quente e o céu, mais azul
E o povo se achando sem chão e sem veste
Viaja à procura das terras do Sul
Porém quando chove tudo é riso e festa
O campo e a floresta prometem fartura
Escutam-se as notas alegres e graves
Dos cantos das aves louvando a natura
Alegre esvoaça e gargalha o jacu
Apita a nambu e geme a juriti
E a brisa farfalha por entre os verdores
Beijando os primores do meu Cariri
De noite notamos as graças eternas
Nas lindas lanternas de mil vaga-lumes
Na copa da mata os ramos embalam
E as flores exalam suaves perfumes
Se o dia desponta vem nova alegria
A gente aprecia o mais lindo compasso
Além do balido das lindas ovelhas
Enxames de abelhas zumbindo no espaço
E o forte caboclo da sua palhoça
No rumo da roça de marcha apressada
Vai cheio de vida sorrindo e contente
Lançar a semente na terra molhada
Das mãos deste bravo caboclo roceiro
Fiel prazenteiro modesto e feliz
É que o ouro branco sai para o processo
Fazer o progresso do nosso país
Cordel de Patativa do Assaré
O dicionário de formas
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Era uma vez eu, Zé Sorveteiro, que me apaixonei por uma princesa que acabara de chegar do outro lado da Terra. Bolei para ela um dicionário de quatro palavras: bola, quadrado, retângulo, triângulo. Japonês se escreve com desenhos. Com desenhos a princesa aprenderia português!
Não demorou, ela estava arrasando. Ia até meu carrinho e pedia, desenhando no ar:
– Triângulo-bola.
Sorvete na casquinha! O dicionário funcionava às maravilhas.
Eu? Mandava bilhetes. Desenhava um quadrado com um triângulo em cima e escrevia: casa!!! Caprichava nos pontos de exclamação. Casa!!! Casa!!! Fácil de entender: casa comigo.
Mas toda princesa tem uma fera para encontrar bilhetes. Uma hora a fera mandou me chamar. Aí…
Aí eu transformei ponto de exclamação em sinal de aguaceiro:
– Um traço com um pingo é chuva. Três – !!! – muita chuva. Casa, chuva, chuva, chuva. Estou só avisando… Cuidado com goteiras.
Acabei subindo e limpando as calhas do telhado do futuro sogro e as de cada um de seus amigos e parentes.
Hoje, 60 anos depois, repito, valeu a pena. E lá vou eu apanhar uns triângulos vermelhos para a minha rainha arrumar no triângulo do retângulo do quadrado da frente. Perfeito. Daqui a pouco a jarra da mesa da sala estará toda perfumada com os… Como é mesmo? Vá lá! Com os triângulos vermelhos.
Não demorou, ela estava arrasando. Ia até meu carrinho e pedia, desenhando no ar:
– Triângulo-bola.
Sorvete na casquinha! O dicionário funcionava às maravilhas.
Eu? Mandava bilhetes. Desenhava um quadrado com um triângulo em cima e escrevia: casa!!! Caprichava nos pontos de exclamação. Casa!!! Casa!!! Fácil de entender: casa comigo.
Mas toda princesa tem uma fera para encontrar bilhetes. Uma hora a fera mandou me chamar. Aí…
Aí eu transformei ponto de exclamação em sinal de aguaceiro:
– Um traço com um pingo é chuva. Três – !!! – muita chuva. Casa, chuva, chuva, chuva. Estou só avisando… Cuidado com goteiras.
Acabei subindo e limpando as calhas do telhado do futuro sogro e as de cada um de seus amigos e parentes.
Hoje, 60 anos depois, repito, valeu a pena. E lá vou eu apanhar uns triângulos vermelhos para a minha rainha arrumar no triângulo do retângulo do quadrado da frente. Perfeito. Daqui a pouco a jarra da mesa da sala estará toda perfumada com os… Como é mesmo? Vá lá! Com os triângulos vermelhos.
Angela Lago
Um encontro fantástico
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– Só falta o Boto – disse o Saci, impaciente.
– Se tivesse alguma moça aqui, ele já teria chegado para seduzi-la – comentou a Serpente Emplumada.
– Também acho – concordou o Lobisomem. – Só que eu já a teria apavorado.
Ouviram nesse instante um rumor à margem do rio. Era o Boto saindo das águas na forma de um belo rapaz.
– Agora estamos todos – disse o Negrinho do Pastoreio.
– E então? – perguntou o Boto, saudando o grupo. – Como estão as coisas?
– Difíceis – respondeu o Saci e soltou uma baforada. – Não assustei muita gente nesta temporada.
– Eu também não – emendou a Serpente Emplumada. – Parece que as pessoas lá no Nordeste não têm mais tanto medo de mim.
– Lá no Norte se dá o mesmo – disse o Boto. – Em alguns locais, ainda atraio as mulheres, mas em outros elas nem ligam.
– Comigo acontece igual – disse o Negrinho do Pastoreio. – Vivo a achar coisas que as pessoas perdem no Sul. Mas não atendi muitos pedidos este ano.
– Seu caso é diferente – disse o Lobisomem. – Você não é assustador como eu, o Saci e a Serpente Emplumada. Você é um herói.
– Mas a dificuldade é a mesma – discordou o Negrinho do Pastoreio.
– Acho que é a concorrência – disse o Boto. – Andam aparecendo muitos heróis e vilões novos.
– Pois é – resmungou a Serpente Emplumada. – Até bruxas andam importando. Tem monstros demais por aí...
– São todos produzidos por homens de negócios – disse o Saci. – É moda. Vai passar...
– Espero – disse o Lobisomem. – Bons aqueles tempos em que eu reinava no país inteiro, não só no cerrado.
– A diferença é que somos autênticos – disse o Negrinho do Pastoreio. – Nós nascemos do povo.
– É verdade – disse o Boto. – Mas temos de refrescar a sua memória.
– Se pegarmos no pé de uns escritores, a coisa pode melhorar – disse a Serpente Emplumada.
– Eu conheço um – disse o Saci. – Vamos juntos atrás dele! – E foi o primeiro a se mandar, a mil por hora, em uma perna só.
Conto de João Anzanello Carrascoza